Mais da metade dos indígenas da Paraiba vive em contexto urbano. Givanildo Silva, pesquisador indígena, aponta que poder público e sociedade no geral precisa observar a realidade dessa população. Tapuias mandando passinho: releitora da obra de Albert Eckhout, pela artista indígena Juliana Gomes
Juliana Gomes/Divulgação
O pesquisador indígena Givanildo Silva afirmou que os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sobre a população indígena paraibana, divulgados nesta quinta-feira (19), mostram “uma realidade que não pode ser negada: a presença indígena nas cidades”. Na Paraíba, são 30.140 pessoas declaradas indígenas no estado e 16.991 vivendo em áreas urbanas, um percentual de 56,37%.
Givanildo Silva, o Giva, membro da Aliança Multiétnica de Indígenas em Contexto Urbano da Paraíba, destaca que a presença indígena em áreas urbanas vem desde a formação das cidades brasileiras, uma vez que muitas delas foram formadas a partir de missões, aldeamentos e diretórios.
“Precisamos considerar a própria origem das cidades, que foram constituídas a partir dos territórios indígenas, onde já existiam diferentes formas de organização indígena, como aldeamentos, missões e diretórios. Vale destacar que os diretórios foram a primeira estrutura burocrática que serviu de base para a constituição dos municípios”.
O pesquisador aponta que o estado, no decorrer dos anos, foi ignorando essa realidade e impondo uma visão de que o indígena era apenas o aldeado.
“Os indígenas sempre estiveram presentes nas cidades, portanto, não há razão para estranhamento. O que realmente surpreende é a forma como o Estado, em muitos casos, desconsidera essa realidade, tentando impor uma visão restrita sobre os povos indígenas. Esse comportamento ignora não apenas a presença indígena, mas também suas diversas formas de organização, que vão além das existentes nos territórios demarcados”.
Além de estar um pouco acima da média do Brasil, que é 53,97%, a Paraíba é o nono estado brasileiro com maior percentual de indígenas em área urbana.
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Os estados com maior percentual de população indígena que vive em áreas urbanas são: São Paulo (87,51%); Sergipe (82,51%); Bahia (78,47%); Amazonas (62,30%); Ceará (61,09%); Espírito Santo (60,52%); Minas Gerais (60,31%); Alagoas (57,24%); Paraíba (56,37%); e Pernambuco (55,10%).
A maioria dos indígenas em áreas urbanas, 60%, está fora de terras indígenas. Do total, 6.721 estão dentro de terras indígenas urbanas e 10.270 fora delas.
Violação de direitos
Givanildo Silva comenta que essa invisibilização por parte do estado do indígena em contexto urbano perpetua violações de direitos. Começando pela formação das cidades, os indígenas passaram a ser chamados de “caboclos” , como uma forma de mostrar que estes já estavam “civilizados”.
“A identidade e a cultura eurocêntricas eram vistas como civilizadoras, promovendo um processo contínuo de etnocídio que perdura até hoje, apesar dos esforços para reverter essa situação”.
A violação de direitos, conforme Giva, começa pelo direito à história e à identidade, que muitos povos indígenas e seus descendentes não têm. Há ainda questões específicas dos povos indígenas, relacionadas à saúde e à educação, que aqueles em contexto urbano precisam acessar.
O pesquisador ressalta que, entre 1890 e 1990, estes povos sequer eram citados no Censo. Foram agrupados na categoria “pardo”. Por isso, há uma possível subnotificação na população indígena das cidades.
“A invisibilização impede que possamos identificar corretamente a situação real dos povos indígenas, já que não contempla, nos indicadores negativos, como pobreza, violência, encarceramento, entre outros, a realidade vivida por esses grupos”.
Há, no entanto, esforços para sanar essas questões, como é o caso de uma Declaração da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, a Funai, de 2024, que reconhece as diversas formas de organização dos povos indígenas.
“Tais correções não apenas combaterão as violências históricas, mas também eliminarão as violações que ainda ocorrem no presente, possibilitando aos indígenas que vivem em contextos urbanizados o pleno acesso à cidadania”.
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Governo Federal/Divulgação
Do total de povos indígenas da Paraíba, 63,1%, 19.044 pessoas, vivem dentro de terras indígenas, enquanto 36,8%, 11096 pessoas, vivem fora de terras indígenas. Na Paraíba, são três os territórios indígenas : Potiguara, Potiguara de Monte-Mor e Jacaré de São Domingos, ambos localizados no Litoral Norte da Paraíba. Há ainda outras comunidades que esperam as demarcações, como aldeias no Litoral Sul do estado.
O IBGE ainda estabeleceu Localidades de Concentração Indígena. Segundo a definição, são áreas que não são aldeias ou comunidades indígenas, mas que possuem um aglomerado de pessoas que se declararam indígenas no último Censo.
Na Paraíba, são 10 as cidades que foram consideradas, segundo o Censo de 2022, Localidades de Concentração Indígena. Começando por João Pessoa, que tem como destaque os abrigos onde reside a população Warao, de origem venezuelana. Na Região Metropolitana, há ainda Bayeux.
No Litoral da Paraíba, são consideradas Localidades de Concentração Indígena as cidades de Baía da Traição, Conde, Marcação, Mataraca, Pitimbu e Rio Tinto. Saindo do Litoral, aparece a cidade de Amparo, localizada no Cariri paraibano, na região de Sumé, e Pombal, no Sertão.
Vale destacar que, mesmo não possuindo aldeias, terras demarcadas ou localidades de concentração, a maioria das cidades paraibanas tem a presença de povos indígenas segundo o Censo 2022.
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Na Paraíba, há 13.149 indígenas vivendo na zona rural. Desse total, a grande maioria, 12.323 (93%), vive em território indígena. Há ainda 826 indígenas vivendo na zona rural fora de comunidades indígenas.
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